Sábado, 21 de Abril de 2007

Poesia na Escola

No dia 17 de Abril, a Poesia andou à solta pela Escola Secundária de Seia.

 

        000326e9

 

Andreia Macedo (http://andreiamacedo.blogs.sapo.pt/) veio até à nossa Escola para nos proporcionar momentos inesquecíveis de poesia.

 

O seu repertório foi muitíssimo vasto, incidindo, sobretudo, em poetas surrealistas.

 

Escutámos poemas de Alexandre O'Neill, Almada Negreiros, António Gedeão, Manuel Bandeira, Alberto Caeiro, Manuel da Fonseca, Wislawa Szymborska, Alexandre Pinheiro Torres, Mário Henrique Leiria, José Gomes Ferreira, Pedro Oom, Mário Cesariny, Joaquim Pessoa, Mário de Sá-Carneiro e Alberto Pimenta.

 

Esta fabulosa "animadora da poesia" proporcionou-nos momentos arrepiantes, perturbantes, envolventes, emocionantes, vivos, originais, extraordinários...

 00031hdw

 

 00030eat

 

0003x0kw

 

0003tygz

 

0003psky

 

0003qas9

 

Foram momentos que para sempre ficarão na alma de todos os que estiveram presentes.

 

Em jeito de curiosidade, aqui deixo alguns poemas que Andreia Macedo nos apresentou.

 

Arma Secreta

Tenho uma arma secreta
ao serviço das nações.
Não tem carga nem espoleta
mas dispara em linha recta
mais longe que os foguetões.

Não é Júpiter, nem Thor,
nem Snark ou outros que tais.
É coisa muito melhor
que todo o vasto teor
dos Cabos Canaverais.

 

A potência destinada
às rotações da turbina
não vem da nafta queimada,
nem é de água oxigenada
nem de ergóis de furalina.

Erecta, na noite erguida,
em alerta permanente,
espera o sinal da partida.
Podia chamar-se VIDA.
Chama-se AMOR, simplesmente.

 António Gedeão

 

                                                           

Alguns gostam de poesia

Alguns -
quer dizer nem todos.
Nem a maioria de todos, mas a minoria.
Excluindo escolas, onde se deve
e os próprios poetas,
serão talvez dois em mil.

 

Gostam -
mas também se gosta de canja de massa,
gosta-se da lisonja e da cor azul,
gosta-se de um velho cachecol,
gosta-se de levar a sua avante,
gosta-se de fazer festas a um cão.

 

De poesia -
mas o que é a poesia?
Algumas respostas vagas
já foram dadas,
mas eu não sei e não sei, e a isso me agarro
como a um corrimão providencial.

 Wislawa Szymborska

                                         

POEMA DO AUTOCARRO

Quantos biliões de homens! Quantos gritos
de pânico terror!
Quantos ventres aflitos!
Quantos milhões de litros
do movediço amor!
Quantos!
Quantas revoluções na cósmica viagem!
Quantos deuses erguidos! Quantos ídolos de barro!
Quantos!
até eu estar aqui nesta paragem
à espera do autocarro.
E aqui estou, realmente.
Aqui estou encharcado em sangue de inocente,
no sangue dos homens que matei,
no sangue dos impérios que fiz e que desfiz,
no sangue do que sei e que não sei,
no sangue do que quis e que não quis.
Sangue.
Sangue.
Sangue.
Sangue.

Amanhã, talvez nesta paragem de autocarro,
numa hora qualquer, H ou F ou G,
uns homens hão-de vir cheios de medo e sede
e me hão-de fuzilar aqui contra a parede,
e eu nem sequer perguntarei porquê.

Mas...

Não há mas.
Todos temos culpa, e a nossa culpa é mortal.

Mas eu só faço o bem, eu só desejo o bem,
o bem universal,
sem distinguir ninguém.

Todos temos culpa, e a nossa culpa é mortal.
Eles virão e eu morrerei sem lhes pedir socorro
e sem lhes perguntar porque maltratam.
Eu sei porque é que morro.
Eles é que não sabem porque matam.
Eles são pedras roladas no caos,
são ecos longínquos num búzio de sons.
Os homens nascem maus.
Nós é que havemos de fazê-los bons.

Procuro um rosto neste pequeno mundo do autocarro,
um rosto onde possa descansar os olhos olhando,
um rosto como um gesto suspenso
que me estivesse esperando.

Mas o rosto não existe. Existem caras,
caras triunfantes de vícios,
soberbamente ignaras
com desvergonhas dissimuladas nos interstícios.
O rosto não existe.

Procura-o.

Não existe.

Procura-o.
Procura-o como a garganta do emparedado
procura o ar;
como os dedos do afogado
buscam a tábua para se agarrar.

Não existe.

Vês aquele par sentado além ao fundo?

Vês?

Alheio a tudo quanto vai pelo mundo,
simboliza o amor.
Podia o céu ruir e a terra abrir-se,
uma chuva de lodo e sangue arrasar tudo
que eles continuariam a sorrir-se.

Não crês no amor?

Não ouves?

Não crês no amor?

Cala-te, estupor.
Tenho vergonha de existir.
Vergonha de aqui estar simplesmente pensando,
colaborando
sem resistir.

Disso, e do resto.
Vergonha de sorrir para quem detesto,
de responder pois é
quando não é.
Vergonha de me ofenderem,
vergonha de me explorarem,
vergonha de me enganarem,
de me comprarem,
de me venderem.

Homens que nunca vi anseiam por resolver o meu problema concreto.
Oferecem-me automóveis, frigoríficos, aparelhos de televisão.
É só estender a mão
e aceitar o prospecto.

A vida é bela. Eu é que devia ser banido,
expulso da sociedade para que a não prejudique.

Hã?

Ah! Desculpe. Estava distraído.
Um de quinze tostões. Campo de Ourique.

António Gedeão, Máquina de Fogo, 1961

                                             

Poema da Menina Tonta

A menina tonta passa metade do dia
a namorar quem passa na rua,
que a outra metade fica
pra namorar-se ao espelho.

A menina tonta tem olhos de retrós preto,
cabelos de linha de bordar,
e a boca é um pedaço de qualquer tecido vermelho.

A menina tonta tem vestidos de seda
e sapatos de seda,
é toda fria, fria como a seda:
as olheiras postiças de crepe amarrotado,
as mãos viúvas entre flores emurchecidas,
caídas da janela,
desfolham pétalas de papel...

No passeio em frente estão os namorados
com os olhos cansados de esperar
com os braços cansados de acenar
com a boca cansada de pedir...

A menina tonta tem coração sem corda
a boca sem desejos
os olhos sem luz...

E os namorados cansados de namorar...
Eles não sabem que a menina tonta
tem a cabeça cheia de farelos.

Manuel da Fonseca

publicado por novosnavegantes às 21:56
link do post | comentar | favorito

.mais sobre mim

.pesquisar

 

.Setembro 2012

Dom
Seg
Ter
Qua
Qui
Sex
Sab
1
2
3
4
5
6
7
8
9
10
11
12
14
15
16
17
18
19
20
21
22
23
24
25
26
27
28
29
30

.posts recentes

. Ela canta, pobre ceifeira

. Trabalhos realizados no â...

. Trailer-Homens Há Muitos

. Semana da Leitura: Sessão...

. Francisco Salgueiro na BE...

. Trabalhos realizados no â...

. "Praia da saudade" de Fra...

. Semana da Leitura: Progra...

. Francisco Salgueiro: entr...

. Concurso Nacional de Leit...

. "Chovem papéis"

. Serão de Memórias - Escol...

. Serão de Memórias -Escola...

. Serão de Memórias - Escol...

. Semana da Leitura: Sessão...

.arquivos

. Setembro 2012

. Abril 2012

. Março 2012

. Novembro 2011

. Setembro 2011

. Junho 2011

. Maio 2011

. Abril 2011

. Fevereiro 2011

. Dezembro 2010

. Novembro 2010

. Outubro 2010

. Setembro 2010

. Junho 2010

. Maio 2010

. Abril 2010

. Fevereiro 2010

. Janeiro 2010

. Outubro 2009

. Julho 2009

. Junho 2009

. Abril 2009

. Março 2009

. Dezembro 2008

. Novembro 2008

. Outubro 2008

. Julho 2008

. Junho 2008

. Maio 2008

. Março 2008

. Fevereiro 2008

. Dezembro 2007

. Novembro 2007

. Outubro 2007

. Setembro 2007

. Julho 2007

. Junho 2007

. Maio 2007

. Abril 2007

. Março 2007

.tags

. todas as tags

.links

SAPO Blogs

.subscrever feeds